A VERDADE DEVE SER MOSTRADA

Divergências de dados da Prefeitura de São Paulo ao MP faz 4.500 famílias de favelas 'sumirem'

O Ministério Público Estadual investiga de que forma, em um intervalo de apenas nove dias, a Prefeitura de São Paulo conseguiu “subtrair” 4.500 famílias que serão retiradas de favelas localizadas nos limites da operação urbana Água Espraiada para habitações de interesse social.

De acordo com o promotor Maurício Antonio Ribeiro Lopes, secretário executivo da promotoria de Habitação e Urbanismo da capital, o número se refere a uma discrepância observada pelo MP em dois ofícios respondidos por órgãos municipais no mês de outubro. A indagação da promotoria era sobre a destinação de moradores dessas áreas por conta das obras.

A prefeitura nega a divergência entre os números e afirma que, entre 2009 e 2010, efetuou o cadastramento de aproximadamente 8.000 famílias.

A operação, que já arrecadou cerca de R$ 3 bilhões só de leilão de Cepacs (Certificados de Potencial Adicional de Construção), prevê a revitalização da região, próxima à avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, na zona sul de São Paulo, com a implementação de habitações sociais, sistema viário e transporte coletivo.

Em um dos ofícios, datado do dia 10 de outubro, a São Paulo Urbanismo informou à promotoria que a intervenção na área da operação Água Espraiada “demanda a retirada e reassentamento de aproximadamente 8.500 famílias”.

No dia 19 do mesmo mês, a São Paulo Obras, em outro ofício à mesma promotoria, respondeu que “atualmente encontra-se contratada a execução de 4.000 unidades para atendimento à população moradora e em habitações subnormais no âmbito de operação urbana Água Espraiada”.

As informações sobre famílias removidas requeridas pela promotoria subsidiam, por exemplo, as investigações sobre incêndios em favelas paulistanas –foram 38 só este ano, de acordo com a Defesa Civil do município.

Os dados também subsidiarão a análise que os promotores fazem da remoção de moradores de favelas localizadas no entorno de 14 empreendimentos imobiliários lançados ou em vias de lançamento na região da avenida Chucri Zaidan, polo comercial de alto padrão do Campo Belo, na zona sul da capital paulista. A área também está dentro do perímetro da operação urbana Água Espraiada.


“Se um órgão fala que serão removidas 8.500 famílias, e o outro, que serão feitas unidades sociais para 4.000 [famílias], o que acontecerá com as 4.500 que restam? Será que elas evaporaram?”, criticou o promotor, que concluiu: “Talvez essa contradição ajude a explicar alguns desses episódios”, afirmou, referindo-se aos incêndios quase que em sequência, no segundo semestre deste ano, em algumas favelas.
Na avaliação de Lopes, o número de casos de incêndio nessas comunidades –em algumas, mais de uma vez –“é pornográfico”.
“É algo pornográfico, assustador, inédito e fora de qualquer padrão de comparação com anos anteriores”, avaliou.
Por outro lado, o promotor afirmou que o MP aguarda os laudos periciais do IC (Instituto de Criminalística) a respeito desses incêndios para confrontar esses documentos e tentar extrair uma linha comum. “Promotor não é pago para acreditar em coincidências, mas para investigar”, definiu.
“Esperamos que a próxima administração paralise essas operações urbanas [são seis, ao todo] –que ocorrem não nas periferias, mas em áreas de potencial valorização imobiliária –no que se refere a esse quadro de remoções. Não acredito que se possa perseverar nessa exclusão que vimos nos últimos seis anos”, declarou Lopes.

SPObras nega divergência de números

A reportagem do UOL entrou em contato com a SP Obras, a SP Urbanismo, a Sehab (Secretaria de Habitação do município) e a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano sobre o assunto. Apenas a SPObras e a Secretaria de Desenvolvimento Urbano responderam. De acordo com a SPObras, “não há divergência entre as informações das empresas SP Urbanismo e SPObras”.

“De novembro de 2009 a setembro de 2010, a Prefeitura de São Paulo, por meio da equipe social da Secretaria Municipal de Habitação (Sehab), realizou o cadastramento das famílias que vivem nas 29 áreas envolvidas na Operação Urbana Consorciada Água Espraiada – 16 áreas de interferência direta para a construção do parque linear e 13 áreas que não serão afetadas diretamente pelas obras –, totalizando aproximadamente 8.000 famílias”, informou o órgão.

Ainda conforme a SPObras, ao todo, serão construídos pela Sehab 4.000 apartamentos em conjuntos habitacionais, além de outras 6.000 unidades a serem feitas em parceria com a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano), “provendo condições dignas de moradia, com toda a infraestrutura necessária (redes de água, luz, esgoto etc.). Todas na própria região da Água Espraiada e construídas com a verba arrecadada da operação urbana.”

 Ofícios ao MP respondem questões distintas, diz secretaria

Já a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano defendeu que os dois ofícios respondidos pela administração municipal ao MP "respondem a questionamentos distintos".

“O ofício encaminhado pela SP Urbanismo responde o número total de famílias que serão atendidas (8.500, considerando-se uma margem de segurança com relação ao cadastro realizado pela Secretaria Municipal de Habitação). O ofício da SP Obras refere-se às unidades de Habitação de Interesse Social já com as obras licitadas, 4.000 no total. As áreas onde os empreendimentos já licitados serão construídos já estão com as ações expropriatórias ajuizadas e vários locais já têm imissões na posse”, informou a pasta.

Ainda conforme a secretaria, "dois conjuntos já foram iniciados" e, mês passado, seis novos decretos de interesse social foram publicados, com uma área total de cerca de 37 mil m² que "deverá ser adicionada às áreas já ajuizadas (cerca de 115 mil m²) para compor a base fundiária onde as UH serão construídas para atender a demanda total". Além dessas áreas, diz a secretaria, "há outras indicadas pela municipalidade à CDHU para que sejam avaliadas e trabalhadas com esta mesma finalidade."


 
noticias.uol.

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